quarta-feira, 17 de março de 2010

Palavra de Escoteiro

Fui escoteiro e escuteiro. Quem foi um dia um deles percebe a diferença. Os outros percebem o essencial – que algures na minha pré-adolescência usei um lenço colorido ao peito e calcei umas meias compridas que prendia com o elástico das jarreteiras.
Há uns dias, em conversa com um cliente que é dirigente escutista, faltou-me energia para o contrariar. Dizia ele, sabendo do meu passado de lenço ao peito, que achava a indumentária escutista desactualizada. Que percebia que os jovens não se revissem naquele fardamento e que, em tempos em que a imagem parece contar quase tanto quanto a substância, dificilmente sentiriam o apelo escutista. À excepção do dia em que a Mariana Cardoso me chamou betinho quando passei por ela de mochila às costas, senti-me sempre bem de lenço ao peito. E para vos ser franco, se tomarmos como excepção que confirma a regra esse dia em que a minha personalidade se vergou perante os lindos olhos da Mariana, achei-me sempre um miúdo sexy naquela farda – a única que tive verdadeiro prazer em usar.
O Francisco e o Luís pareceram-me bem orgulhosos dos seus uniformes. Lembraram-me que nunca na vida vou cuidar de uma gravata como cuidei daquele lenço. E deixaram-me saudoso daquelas noites à volta da fogueira em que cantávamos o menina estás à janela, o dunas, a versão portuguesa disto e uma mão cheia de hits dos Resistência. Disso e daqueles olhares cúmplices que, por entre as achas da fogueira, deixavam no ar o desejo de um primeiro beijo à socapa, entre o último chichi da noite e o caminho para a tenda. Vou-vos ser sincero. A minha saída dos escuteiros não foi das mais épicas. Fui suspenso. Perguntaram-me o que achava e voltou a faltar-me a mesma energia que já me havia falhado no início do post. Mas senti saudades. Da fogueira, do lenço e das jarreteiras. Ainda sinto. A sério. Palavra de escoteiro


em O Alfaiate Lisboeta, 26 de Novembro de 2009

Sem comentários: